28.5.12



a luz que começa a entrar timidamente no quarto escuro me faz te perceber ao meu lado, dormindo tranquilo. então todos os meus sentidos se aguçam e o cheiro de sono, de sexo e de violência invade as minhas narinas, tão maltratadas pelo vício; e eu sinto o calor da tua perna direita contra a minha perna esquerda; e escuto a tua respiração forte, que me dá a certeza e o alívio da tua condição de coisa que dorme. a tua respiração invade os meus ouvidos e perturba os meus pensamentos como um vento forte que entra pelas janelas e sacode as cortinas. e esse som vai ficando cada vez alto, cada vez mais insuportável, cada vez mais per-tur-ba-dor. como - eu me pergunto - como podes dormir tão profundamente depois de toda essa violência, toda essa intimidade devastada, essa realidade descoberta? te olho e sinto um carinho profundo (porque não parece haver nenhuma cena mais reveladora da fragilidade humana quanto a de alguém dormindo) e sinto, ao mesmo tempo, uma raiva tão profunda quanto o carinho por conseguires dormir enquanto eu me desfaço por dentro, enquanto eu me dilacero pensando em como somos egoístas até nos momentos de maior cumplicidade.

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